terça-feira, 25 de janeiro de 2011

QUEM É O CULPADO?

A SÍNDROME DE CAIM
*Pr. Edivaldo Rocha

“Coabitou o homem com Eva, sua mulher. Esta concebeu e deu à luz a Caim; então, disse: Adquiri um varão com o auxílio do Senhor. 2Depois, deu à luz a Abel, seu irmão. Abel foi pastor de ovelhas, e Caim, lavrador. 3Aconteceu que no fim de uns tempos trouxe Caim do fruto da terra uma oferta ao Senhor. 4Abel, por sua vez, trouxe das primícias do seu rebanho e da gordura deste. Agradou-se o Senhor de Abel e de sua oferta; 5ao passo que de Caim e de sua oferta não se agradou. Irou-se, pois, sobremaneira, Caim, e descaiu-lhe o semblante. 6Então, lhe disse o Senhor: Por que andas irado, e por que descaiu o teu semblante? 7Se procederes bem, não é certo que serás aceito? Se, todavia, procederes mal, eis que o pecado jaz à porta; o seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo” (Gn 4:1-7).

            Essa última semana soube de alguém que estava sobremodo enfurecida com Deus por conta dessa passagem bíblica que acabamos de ler. Ao se deparar com a história de Caim e Abel a jovem acusara Deus de ser egoísta. Ela dizia que Deus valorizou a oferta de Abel e desprezou de Caim, visto um ter oferecido um animal e o outro, apenas vegetais.
            Achei interessante a indignação da jovem e resolvi me deter nessa passagem e acompanhem o que eu descobri:

                       I.        DEUS NÃO É EGOÍSTA, MUITO MENOS MAL-AGRADECIDO
Deus não é egoísta, muito menos mal-agradecido. Essa afirmação parece ser óbvia, mas para quem não tem conhecimento das Escrituras é fácil confundir o que Deus faz de bom com coisas ruins.
A jovem questionava a generosidade de Deus por achá-lo egoísta. Talvez ela desconheça o que ele fez pela humanidade. Quando nós abrimos nossas Bíblias no evangelho de João 3:16 notamos até que ponto pode ir a generosidade de Deus em relação a ser humano:
“Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.”

O amor de Deus é um amor que se doa (ele próprio se doou para salvar-nos da perdição).

                            II.        O PROBLEMA DA OFERTA
Quando voltamos para o episódio de Gênesis e levando em consideração a oferta apresentada, chegamos à conclusão que não se tratava de animais ou vegetais, e sim de intenções abrigadas no coração. Reparem o que narra os versos seis e sete:
“Então, lhe disse o Senhor: Por que andas irado, e por que descaiu o teu semblante? 7Se procederes bem, não é certo que serás aceito? Se, todavia, procederes mal, eis que o pecado jaz à porta; o seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo.”

O coração de Caim estava cheio de amargura que não permitia que ele percebesse que não era “o que”, mas “como” a oferta estava sendo entregue. O salmista conhecia essa verdade e narrou o seguinte: “Se eu no coração contemplara a vaidade, o Senhor não me teria ouvido” (Sl 66:18). Logo no início do seu ministério, Jesus alertou os discípulos sobre essa questão e disse que quando tivéssemos alguma queixa contra alguém, era preciso deixar a oferta no altar e voltarmos para nos reconciliamos com nosso irmão (Mt 5:24). O crente pode oferecer um milhão de reais, mas se seu coração abrigar a vaidade, o rancor, a indiferença ou o ódio, jamais essa oferta chegará diante do seu Deus com cheiro suave.

                               III.      DEUS DEMONSTRAVA MAIS ATENÇÃO E CARINHO PARA COM CAIM, QUE PARA COM ABEL

Se nós olharmos para essa história com mais atenção perceberemos que quem morreu foi o Abel e não o Caim. Poderíamos perguntar, por que Deus não livrou Abel, já que sua oferta foi aceita e a de Caim não?
Alguns podem considerar Deus um traidor. Porém, como na história do filho pródigo, Abel já tinha tudo (e ele sabia disso, diferente do filho mais velho da parábola), daí Deus, de certo modo não livrá-lo, pois Abel já tinha um lugar preparado.
Por que Deus muitas vezes não livra os crentes da morte? Porque eles estão prontos.
Às vezes nós nos esquecemos de olhar a vida pela perspectiva de Deus e consideramos a morte do crente uma perda irreparável. Mas na realidade, e como bem disse Martin Luther King Jr., todas as coisas que guardamos conosco, essas nós perdemos. Contudo as que guardamos nas mãos do Deus, essas teremos eternamente. Ninguém mais poderia tocar em Abel, pois ele estava agora guardado nas mãos do Senhor.
Quem não estava pronto era Caim. Nesse contexto, percebemos um comportamento, da parte de Deus, no mínimo interessante.
No Antigo Testamento Moisés conheceu a Deus como Ihavé (Eu sou) Jacó chamou a Deus de El-Shadday (Deus todo-poderoso); Agar chamou a Deus de El- Ray (Deus que me vê); Abraão chamou de El-Olam (Deus Eterno). Muitos outros nomes foram dados a Deus, mas no Novo Testamento, Jesus chamou a Deus de Abba (papai). E foi com o comportamento de um pai que Deus se manifestou a Caim.
O que acontece com os filhos rebeldes, considerados as ovelhas negras da família? Os pais desferem mais atenção, mais carinho. Os irmão e parentes de “ovelhas negras” geralmente dizem, “fulano só dá trabalho e desgosto, mas é o preferido da mamãe”. Os que estão em volta dos que são rebeldes, às vezes, não entendem que não é uma questão de preferência, e sim de cuidado, é um desejo que o rebelde se ajeite, que aproveite a vida, que seja feliz.
Caim, a exemplo de muitos filhos rebeldes, não entendeu que o Senhor quis ser-lhe um pai. Ele mesmo se achou discriminado e rejeitado, quando na realidade ele foi o mais amado.

                               IV.      SÍNDROME DE CAIM
Ao ler essa passagem também descobri que hoje muitas pessoas vivem essa “Síndrome de Caim”. Acham que seus pais, que Deus, que a igreja, e o resto do mundo estão contra elas. Com isso acabam por se enclausurar em prisões psicológicas que em muitos casos e infelizmente levam a tragédias. A história de Caim tinha tudo para ter um final feliz. O único a não querer esse final feliz foi próprio Caim. Deus o havia alertado “eis que o pecado jaz à porta; o seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo” (Gn 4:7).
Isso pode até parecer cruel, mas os nossos dilemas, as nossas crises as nossas neuroses e as nossas perturbações e os nossos complexos somos nós mesmos que teremos que tratar. Porque não há tratamento que não dependa primeiramente da pessoa afetada. A pessoa pode tomar caixas e mais caixas de antidepressivos, ansiolíticos, frequentar os melhores psiquiatras e psicólogos e até ir para sessão do descarrego, porém nada disso terá efeito se a pessoa afetada não se dispor a mudar a sua situação. O complexo de inferioridade, o sentimento rancoroso e homicida que estavam na mente de Caim, só ele mesmo poderia dominar. E o nome disso é liberdade (ou livre-arbítrio) para ser o que você quiser ser.

                                  V.      DEUS AMOROSO E RESPEITADOR DE NOSSA VONTADE
No final de tudo descobri, ou relembrei com base nessa passagem que Deus é um Deus que respeita a nossa vontade, não obstante nos amar deliberadamente como um pai ou uma mãe ama seus filhos.
É um amor tão desprendido que ele mesmo se doou pelas “ovelhas negras”, pelos “filhos rebeldes” só para que eles e aqueles que os rodeiam entendessem que eles são verdadeiramente amados, como você e eu.
Depois de descobrir e relembrar tudo isso me interrogo acerca de algumas coisas:
·     Oferta – como minha oferta chega à casa do Senhor? Ela chega cheia de gratidão ou vem espremida no saco de rancor e amargura?
·     Comportamento – eu me comporto como filho que reflete o amor do Senhor ou como filho rebelde, complexado colocando a culpa das minhas frustrações em tudo e em todos, sem buscar saná-las?
·     Entendimento – será que tenho procurado entender no tempo oportuno que quando Deus chama a minha atenção é porque ele me ama.
Hoje as escolas, os ambientes de trabalho, as igrejas e as famílias estão cheias de pessoas que vivem a “síndrome de Caim”. O que falta a essas pessoas é entender que Deus as ama, que suas famílias as amam.
É preciso dar um basta nessa culpabilização dos outros por traumas que são nossos. Na verdade não há culpados nessas histórias, só vítimas, que precisam ser resgatados com amor. Mas até o amor precisa ser aceito.
Caim não aceitou o amor de Deus e preferiu se isolar mais e mais nas suas angústias. É triste ver isso acontecer. Por isso jamais cessem de falar do amor de Deus que curas as feridas daqueles que permitem uma ação divina. Os “Cains” que estão a nossa volta precisam entender que em Cristo há solução para suas vidas. Deus jamais rejeita aqueles que o buscam de coração. Reflita nessas coisas. Amém!

Nenhum comentário:

Postar um comentário