CAJADO, VARA E PASTOS VERDEJANTES
*Pr. Edivaldo Rocha
O salmista Davi escreveu um dos poemas mais belos da literatura sagrada. Mesmo datando de mais de três mil anos, o Salmo 23 ainda hoje inspira à fé em muitos corações.
Hoje para dar base à nossa reflexão, lerei este salmo, mas em uma versão diferente, lerei conforme a reescrita do poeta que disse assim:
Há um pastor que me protege. Ele me leva aos lugares de grama verde e sabe onde estão as fontes de águas límpidas. Uma brisa fresca refresca a minha alma. Durante o dia ele me pega no colo e me conduz por trilhas amenas. Mesmo quando tenho de passar pelo vale escuro da morte eu não tenho medo. A sua mão e o seu cajado me tranqüilizam. Enquanto os lobos uivam, ele me dá o que comer. Passa óleo perfumado na minha cabeça para curar minhas feridas. E me dá água fresca para sarar o meu cansaço. Com ele não terei medo, eternamente... (paráfrase do Salmo 23 – Por Rubem Alves – A tranquilidade das ovelhinhas).
Fiz essa leitura um tanto fora do padrão, ao qual estamos acostumados, para trazer a nossa memória a essência desse salmo. Talvez alguém já possa estar pensando o seguinte: “pastor Edivaldo, o salmo 23 é claro como a água e não precisa de paráfrases para ser entendido”. Se alguém pensa assim, não tenho como discordar, pois eu também acredito nisso. Contudo, não foram poucas as vezes que me chegaram aos ouvidos expressões que refletem uma tamanha falta de entendimento da figura do pastor que o salmo 23 deixa claro como a água.
É certo que o salmista faz uma analogia do cuidado de Deus para com o homem, com a figura do pastor que cuida de suas ovelhas. Em outras palavras Deus é aquele que cuida do seu povo.
Graciosamente essa analogia também foi empregada a homens que se dispuseram ao serviço ministerial na casa do Senhor, mas nem por conta disso, deixaram de confundir o verdadeiro sentido da representação que o título de pastor possui.
E na tentativa de resgatar essa graciosa representação, lanço mão desse texto tão belo e sobremodo orientador para os filhos de Deus.
· O PASTOR USA UM CAJADO
Há alguns crentes que parecem estarem revoltados com o mundo e com sua igreja. Certos irmãos só se sentem felizes se o pastor pregar agressivamente, acusando as pessoas de seus pecados. Parece que outros têm essa mesma ideia com relação a sua própria pessoa. É uma espécie de sadomasoquismo religioso que quanto mais agressivo o mensageiro é, mais ele diz “eu gosto é assim”.
Existe uma expressão que esse tipo de crente utiliza, fazendo referência ao pastor: geralmente ele diz “que pastor que é pastor tem que bater com o cajado”.
Você sabe o que é um cajado? O cajado é uma peça de madeira com a parte superior recurvada que possui duas funções básicas: a primeira é poder puxar os animais para próximo dele com o gancho que a curva proporciona. Isso evita que o pastor fique correndo atrás do bicho. O pastor se aproxima do animal (ou aproveita a proximidade deste) e o puxa para perto de sua pessoa, a fim de manuseá-lo. A outra função do cajado é oferecer apoio nos terrenos acidentados. Essa função faz com que o pastor evite esforçar-se demais na subida ou descida de algum terreno acidentado.
Esta segunda função é mais utilizada que a primeira e dá a esse instrumento um aspecto de ajuda, não de agressão como muitos pensam: o cajado não foi feito para bater nas pessoas, mas para dar apoio ao pastor nos terrenos difíceis.
Pensando nessa representação de apoio, também pensei acerca do que pode ser o cajado do pastor nos dias de hoje. Entendendo essa função ajudadora do cajado, cheguei à conclusão que o cajado do pastor nos dias de hoje é sua família.
Quando um pastor está passando por alguma dificuldade quem geralmente lhe dá apoio: a esposa e os filhos.
Quer deixar um pastor desestabilizado? Mexa com sua família. Quando uma igreja oprime a esposa do pastor e pressiona os seus filhos, essa igreja trabalha para que seu pastor perca a estabilidade. E pastor instável é presságio de rebanho mal cuidado.
Por outro lado, uma igreja que quer ver o seu pastor bem apoiado e seguro de si independente do terreno que tenha que trilhar, essa igreja investe na família do pastor, principalmente em oração.
· O PASTOR USA UMA VARA
Outro instrumento próprio do ofício de um pastor é uma vara. Esse instrumento não carece de maiores descrições pela obviedade que seu nome representa. Porém, interpretações equivocadas apresentam esse instrumento como equipamento de tortura.
É certo que em dados contextos a vara pode servir para punir alguém, mas toda a sua funcionalidade é atribuída a quem a manuseia.
Se entregarmos uma vara na mão de uma criança o que ela fará? Ela fará dela um brinquedo: possivelmente um cavalinho. Se entregamos essa mesma vara na mão de um carrasco, ele fará dela um instrumento de tortura. Ou seja, a funcionalidade dos instrumentos dependerá daquele que os manusearem.
Quando entregamos uma vara na mão de um pastor esperamos que ele a use diferente de uma criança e também diferente de um carrasco. Se uma vara foi fabricada para punir, ela não deveria estar na mão do pastor, e sim na do carrasco.
Se alguns crentes escutassem o que vocês estão escutando hoje, talvez eles ficassem bem desapontados. Existe crentes que pensam que o cajado e a vara foram entregues aos pastores para eles “descerem a madeira” nas ovelhas.
Tentem imaginar um pastor que sai com seu rebanho e em certo momento, depois de percorrer alguns quilômetros, uma das ovelhas faz algo que atrapalhasse a condução do restante do rebanho; imaginem também esse pastor pegando a sua vara para bater na ovelha, o que aconteceria? A ovelha ficaria com dificuldade para andar e atrasaria o restante do rebanho e para não chegarem tarde ao aprisco, o pastor agressor teria que carregar essa ovelha nos ombros.
Vocês sabem quanto pesa uma ovelha? Dependendo do porte, uns 50kg. Conseguiram imaginar uma pastor percorrer 3KM com 50kg nos ombros?
Agora a resposta da pergunta que não quer calar: na mão do pastor a vara serve para quê? Serve para evitar que as ovelhas saiam do rebanho.
É comum na condução de um rebanho de ovelhas, elas caminharem uma ao lado da outra em uma direção determinada. E também é comum algumas saírem dessa formação, então quando isso acontece, o pastor toca com a vara na lateral da ovelha que quer se desgarrar, para que ela siga ao lado das outras.
Esse toque deve ser suave, pois uma pancada causaria dor, berros e dispersão das demais ovelhas por medo do ocorrido.
Isso significa que a vara é Palavra de Deus que não foi feita para agredir as pessoas, mas para conduzi-las como igreja (como rebanho do Senhor) e para tocar os corações desacreditados, a fim de reconciliá-los com o rebanho santo.
A essa altura da mensagem, novamente alguém possa pensar: “pastor tem crente que é “nó cego” e só se ajeita na ignorância. É verdade, mas deixem-me compartilhar algo. Essa última semana estava procurando algumas imagens de ovelhas dando coice no Google imagens. Depois de procurar por um bom tempo, não encontrei nada que satisfizesse a minha pesquisa. Depois disso conclui que coices não próprios das ovelhas, pois uma de suas características é a mansidão. Uma ovelha é por natureza mansa, mas de fato há muitos crentes ariscos que não atendem a voz doce do pastor, porque esses crentes não são ovelhas ou não se comportam como elas. Esses crentes estão mais para bodes, hienas, chacais, mas não ovelhas. Isso nos faz pensar que o pastor foi chamado para pastorear ovelhas que são por natureza mansas, contudo se como crentes nos comportamos como bodes, hienas ou chacais receberemos um tratamento idôneo, mas se nos comportamos como ovelhas, nosso pastor nos tratará como ovelhas.
· O PASTOR NOS CONDUZ A PASTOS VERDEJANTES
Quando entendemos essas coisas, percebemos que um pastor não é um carrasco de plantão, mas é alguém a quem Deus elegeu para conduzir o seu povo a pastos verdejantes e a fontes de águas límpidas que matam a sede e refrigeram a alma.
Nos fim das contas o Salmo 23 nos mostra que o pastor da igreja é aquele que cuida, alimenta e conduz as ovelhas do Senhor
O Salmo 23 também, ou principalmente, nos fala do Sumo Pastor que zela pela vida das suas ovelhas e pelas vidas daqueles que foram comissionados para exercerem esse ofício.
Por fim, não poderíamos deixar de mencionar que o dia do pastor é o dia em que lembramos, de modo especial, que Deus coloca pessoas maravilhosas em nossa vidas, que respondem pelo ofício santo de pastor. Não falo isso por ser pastor, e sim por também ser ovelha e por ter o privilégio de desfrutar da orientação de pessoas maravilhosas em minha vida que atendiam pelo título de pastor. E por isso devemos sempre ser gratos. Amém!
